Não fosse a pandemia causada pelo coronavírus, Elísio Medrado daria início, nesta quinta-feira (23), à edição de número 26 da sua festa de São João. Após as pausas em 2020 e 2021, por causa das restrições causadas pela covid-19, o evento está de volta e será realizado pela 24ª vez. Você sabe como tudo começou e o quanto ele evoluiu?
Era uma noite de junho de 1995 quando o então vereador Domingos Peixoto teve a ideia de fazer um arraiá na Praça Salvador Andrade, em frente à prefeitura. “Eu vim da zona rural, em um caminhão que estava todo sujo de lama. Quando cheguei na cidade, alguns jovens me pediram uma carona para irem para o São João de Amargosa. Eu levei eles e foi aí que pensei: ‘vou ser prefeito e fazer o São João de Elísio Medrado'”, lembra Domingos.
Em outubro do ano seguinte, Domingos Peixoto foi eleito prefeito e, em junho de 1997, cumpriu a promessa feita para si. Embaixo de uma cobertura construída com madeira e coberta com folhas de palmeira, foi realizada a primeira edição do São João de Elísio Medrado.
O então prefeito contratou atrações da cidade e da região do Recôncavo, como fazia a maioria das cidades vizinhas. Para quem nunca havia tido São João na cidade, os shows foram dignos de grandes festivais. Esse foi o sentimento da população na edição de estreia. Se apresentaram, por exemplo, Zé de Belém, Café do Caruso, Otacílio e Banda, entre outros. Nas edições seguintes também teve Liu Sanfoneiro, Tempero da Terra, Claudir Cigano e Quinka dos Oito Baixos.
“Teve um ano que contratamos Quinka para fazer duas horas de show, mas o forró foi tão bom que o povo ficava pedindo mais uma música e ele acabou tocando e cantando por quatro horas”, relata o ex-prefeito.
Nos idos de 97, a internet ainda engatinhava no Brasil e quem possuía o serviço era de forma discada, através da rede de telefonia fixa. A conexão era lenta e instável. Então, sem redes sociais, como era divulgado o São João de Elísio Medrado para atrair o público? Aí entravam em cena o carro de som, os panfletos e os cartazes, que eram colados nos comércios do município. E para quem não tinha transporte para se deslocar da zona rural para a festa, ônibus eram colocados à disposição. Até hoje isso é feito.
Atrações de maior expressão
Muitos artistas já subiram no palco – e também no trio – do São João de Elísio Medrado. Isso mesmo! Algumas edições do evento foram realizadas em cima do trio elétrico, que ficava estacionado na Praça Salvador Andrade.
Entre 2001 e 2004, sob o comando de Aloísio Andrade, a estrutura do evento teve, digamos, um upgrade, e passou a contar com palco, som e iluminação maiores, além de barracas padronizadas. A ornamentação também ganhou o toque de Mário Campos, artista da cidade. Com relação às apresentações, a prefeitura passou a contratar artistas como Aduílio Mendes (ex-Mastruz com Leite), Canindé, Márcio Moreno e Clone de Mim, ‘febres’ em todo o Nordeste. De 2005 a 2008, Aloísio continou à frente do município e outras grandes atrações passaram por aqui.
“Vimos que o São João de Elísio Medrado tinha grande potencial para atrair o público que queria curtir a festa junina em uma cidade menor, mais segura e mais aconchegante. Pensamos também no retorno financeiro para a economia do nosso município. Por isso passamos a contratar atrações de maior expressão e que estavam no auge de suas carreiras”, explica Andréa Andrade, uma das responsáveis pela organização da festa nas duas gestões de Aloísio Andrade e nos dois primeiros anos de Júnior Andrade.
Na gestão de Everaldo Caldas, entre 2009 e 2012, Cangaia de Jegue, Seu Maxixe, Ademar Furtacor, Tio Barnabé e outras bandas do auge atraíram um grande público. No entanto, em 2010, por pouco a festa de São João não foi cancelada. Uma intensa seca atingia o Nordeste brasileiro, inclusive a Bahia, e após rumores sobre um possível cancelamento, o evento foi mantido em Elísio Medrado.
Com Júnior Andrade na prefeitura, o São João de Elísio continou com fôlego e outras bandas e artistas solo subiram ao palco. Como exemplo, podemos citar Caviar com Rapadura, Canindé, 100 Parêa e Sem Retoque.
Substituto de Júnior na prefeitura, Robson Souza seguiu a linha de atrações renomadas para o São João de 2017 a 2019, com França (ex-Mastruz com Leite), Taty Vaqueira, Canários do Reino e Chambinho do Acordeon.
Pandemia e retorno dos festejos
Você deve ter reparado que, no parágrafo anterior, nos referimos sobre a festa de 2017 a 2019 e pulamos 2020. Se em 2010 houve risco de cancelamento, dez anos depois isso foi inevitável. O São João 2020 foi cancelado por causa da pandemia de covid-19 e a pausa se estendeu até 2021. Este ano, com a maior parte da população vacinada e com baixo número de casos ativos, as cidades voltaram a se enfeitar e contratar as atrações para atrair moradores e visitantes para suas praças.
Em Elísio Medrado, o São João no Paraíso será realizado desta quinta-feira (23) a domingo (26). O prefeito Linsmar Moura trará para a festa atrações como Jonas Esticado, Michele Andrade, Chambinho do Acordeon, Estakazero e França. Jonas Esticado, por sinal, costuma fazer shows em várias partes do Brasil e integra o escritório Balada, que pertence ao sertanejo Gusttavo Lima.
Este ano, o tema do São João de Elísio é “Reencontro da Tradição”. Por este motivo, a grade de atrações é formada, em sua maioria, por bandas e músicos que cantam forró. “Selecionamos atrações que prezam pelo forró. São artistas conhecidos não só aqui na Bahia, mas em grande parte do Brasil. Temos também, no circuito da festa, uma vila que nos remete à Elísio Medrado de outrora, além de uma decoração que torna nossa cidade ainda mais aconchegante para os moradores e visitantes que vão curtir nosso São João”, disse o prefeito Linsmar Moura.
Portas fechadas na zona rural
Para que o São João de Elísio Medrado se consolidasse, as comemorações nas casas da zona rural do município tiveram que abrir passagem para as grandes atrações que se apresentaram e vão se apresentar na Praça Salvador Andrade, cuja cobertura, reinaugurada recentemente, recebeu o nome de José Luiz Almeida da Silva, o Jotinha, que morreu em novembro de 2020, vítima da covid-19.
Era comum, até 1997, a reunião entre vizinhos nos diversos povoados. Enquanto os adultos bebiam licor e dançavam forró na sala da casa, crianças se esbaldavam no terreiro com um saco repleto de bombinhas e outros fogos de artifício. Com o tempo, a tradição foi desaparecendo porque os jovens passaram a buscar diversão na zona urbana. O resultado dessa migração é fogueira acesa, solitária, e portas e janelas fechadas.
De acordo com o historiador Clóvis Ramaiana, a tendência é que o pouco de comemoração que ainda há em alguns povoados do interior baiano, inclusive em Elísio Medrado, vá se acabando, como vem ocorrendo ao longo dos anos. “Para usar a expressão de um velho amigo meu, ‘a roça acabou’. Diminuiu a população. Boa parte das pessoas ou é muito idosa ou muito jovem. Para formar uma sociabilidade, duraria muito tempo”, argumenta.